Para entidade, texto da PEC 45/2019 pode comprometer a sobrevivência de inúmeros municípios brasileiros no futuro, inclusive gaúchos

Preocupada com o futuro dos municípios brasileiros, especialmente os gaúchos, a Famurs emitiu uma Carta Aberta à bancada gaúcha na Câmara dos Deputados a respeito das mudanças no texto da reforma tributária. Em tramitação pela PEC 45/2019, a proposta alertou os gestores municipais, pois traz em sua redação pontos capazes de comprometer a sobrevivência financeira das administrações municipais. 

Na Carta, a Famurs se posiciona contra o texto da atual PEC 45/2019 e justifica sua posição em virtude da ausência de equilíbrio e de justiça na divisão dos recursos arrecadados com tributos sob o consumo, além de evidenciar enorme prejuízo a ser causado caso a reforma seja aprovada na forma como está. 

A Famurs entende que a nova sistemática de distribuição dos recursos arrecadados altera consideravelmente o pacto federativo, uma vez que redefine a distribuição dos recursos arrecadados para cada um dos entes federativos no que tange aos impostos sobre o consumo. Desta forma, a mudança altera significativamente a receita de todos os entes, entregando maior quantidade de recursos para onde houver mais consumo, prejudicando os municípios com característica produtora. 

“O posicionamento da Famurs é resultado do texto aprovado no Senado, que desprezou os alertas realizados aos senadores. Agora, com o texto tramitando na Câmara, teríamos a possibilidade de uma emenda substitutiva, a fim a não comprometer a sobrevivência de muitos municípios brasileiros no futuro. Mas o que vemos é a formação de um acordo de líderes para que se aceite apenas emendas supressivas e, desta forma, a PEC não tenha que retornar ao Senado”, evidencia o presidente da Famurs e prefeito de Campo Bom, Luciano Orsi. 

Na Carta, a Famurs também defende a alteração do critério de distribuição da cota-parte pertencente aos municípios e devida pelos Estados, em que a regra proposta na PEC é a de distribuição de 80% do valor como critério exclusivo de proporção à população. A proposta da Famurs é que seja atribuído, no mínimo, 50% do valor distribuído conforme a geração de riqueza de cada município, com esse índice vinculado ao nível de produção primária, industrial e serviços. 

“A forma de dar equilíbrio e sustentabilidade aos municípios de pouco consumo e produção primária, seria estabelecendo critérios na distribuição da cota-parte de 25% do valor arrecadado pelo Estado, regra existente no ICMS e preservada no IBS. Entretanto, para o IBS muda os critérios de distribuição, ficando 80% da cota-parte distribuídos pelo critério populacional, 10% por índices de educação, 5% com critério de preservação ambiental e 5% de forma igual para todos os municípios. Ou seja, beneficiam-se novamente os municípios de maior densidade populacional”, explica o coordenador de Receitas Municipais da Famurs, Fernando Luz Lehnen.

Caso não seja possível mudar os critérios, a Famurs ainda sugere que seja definido, no mínimo, 50% do valor a ser distribuído da cota-parte pertencente aos municípios seja definido por legislação estadual, permitindo que cada Estado crie uma legislação que promova crescimento e desenvolvimento igualitário em seus municípios, conforme previsto na Constituição Federal. 

Por fim, no documento, a Famurs declara não admitir a eliminação das cota-partes devida pelos Estados aos municípios sob o pretexto de o imposto ser único, pois a medida inviabilizaria a distribuição de riqueza, empobrecendo ainda mais os municípios pouco consumidores. 

“Sabemos que haverá um período de transição de 50 anos e que os efeitos indicados serão sentidos apenas ao longo do tempo. Mas restará aos municípios atingidos apenas definir como encolherão seus orçamentos, seja diminuindo os serviços ofertados à população, seja reduzindo seus funcionários. Os efeitos decorrentes são inúmeros, inclusive no que compete à sustentabilidade dos fundos previdenciários e gastos com pessoal”, alertou o presidente Orsi. 

A Carta Aberta, com posicionamento da Famurs, foi encaminhada na tarde de segunda-feira (27/11) aos deputados federais que compõem a bancada gaúcha. A entidade também se colocou à disposição dos parlamentares para ampliar o debate e auxílio em dúvidas que ainda possam existir sobre a PEC em apreciação na Câmara. 


Leia a Carta Aberta na íntegra:

Carta Aberta à Bancada Federal Gaúcha,

Senhores Deputados Federais,

O texto da Reforma Tributária que se encontra em tramitação por meio da PEC 45/2019 traz em sua redação perigo capaz de comprometer a sobrevivência de inúmeros municípios brasileiros no futuro, inclusive gaúchos.

A nova sistemática de tributação sobre o consumo, sob o ponto de vista dos contribuintes, pode ser chamada de imposto sobre o valor agregado. Entretanto, sob o ponto de vista da distribuição dos recursos arrecadados, o mesmo não pode ser dito. A redação do § 4º do artigo 156-A proposto na PEC 45/2019 deixa claro que a distribuição dos recursos arrecadados se dará ao município de destino final da mercadoria ou serviço, ou seja, do local de consumo. 

Essa proposta de redação, para muito além de reformar o sistema tributário nacional, altera consideravelmente o pacto federativo, porquanto redefine a distribuição dos recursos arrecadados para cada um dos entes federativos no que tange aos impostos sobre o consumo. Assim, é fácil concluir que estamos alterando de forma significativa a receita de todos os entes nacionais, entregando maior quantidade de recursos para onde houver mais consumo, em claro prejuízo aos municípios que se caracterizam por serem produtores.

É público e notório que o consumo se concentra em grandes centros urbanos, onde há maior população, e, por consequência, onde há maior quantidade de consumidores. É fácil concluir, portanto, sem a necessidade de se recorrer a números fantasiosos, que a maior parte dos valores arrecadados ficarão com os municípios que tenham concentração populacional.

Essa situação, sob o ponto de vista de entrega de serviços diretos à população, dá uma falsa sensação de justiça fiscal. Entretanto, sob o ponto de vista produtivo causa distorção ao sistema. Isso porque aqueles municípios que tenham pujança produtiva, seja no setor primário, seja no setor industrial, e que tenham diminuta população, verão suas arrecadações caírem de tal forma que não será suficiente nem mesmo para manter suas estruturas administrativas. Sabe-se que há no texto uma regra transitória para a distribuição dos recursos arrecadados, entretanto, superado o prazo transitório, o resultado que se avizinha é a distribuição de recursos aos municípios mais consumidores, desprezando a produção e, consequentemente, condenando a extinção os municípios de produção primária e empreendedores de menor população que hoje tem estruturas eficientes e oferecem excelente qualidade de vida a seus habitantes.

A solução para essa controvérsia se resolveria por meio da divisão da cota parte dos municípios no IBS (os 25% que os Estados devem repassar aos Municípios). Essa importante quantia de distribuição obrigatória dos Estados para os Municípios, tem por premissa o desenvolvimento equilibrado de cada estado brasileiro, respeitando o que preconiza os incisos II e III do artigo 3º da Constituição Federal. Assim, se fosse aplicada parte da distribuição da cota-parte com critérios como produtividade de cada município, traríamos equilíbrio aos municípios preocupados com a produção nacional.

Entretanto, essa não foi a opção da PEC 45 /2019 até o momento. Ao definir a distribuição da cota-parte pertencente aos municípios e devida pelos estados, a PEC propõe como regra a distribuição de 80% do valor da cota parte como critério exclusivo de proporção à população dos municípios de cada estado. 

Percebe-se, assim, a ausência de equilíbrio e de justiça, na divisão dos recursos arrecadados com tributos sob o consumo. Privilegiam-se municípios de maior densidade populacional, considerando um maior mercado consumidor.  

Em via contrária, a lógica do que se apresenta nesse projeto de alteração de nossa Carta Maior é cristalina quanto ao esvaziamento de recursos que ocorrerá em municípios de produção primária e municípios de pouca população com industrialização avançada.

As propostas que a FAMURS apresenta preserva os municípios que organizaram suas matrizes econômicas ao longo dos anos, impedindo perdas significativas, e melhora os ganhos dos municípios de grande população que necessitam de maiores recursos para o atendimento de suas demandas. Buscamos o equilíbrio, auxiliando as populações mais pobres sem inviabilizar os municípios menores.

Assim, a FAMURS posiciona-se:

  1. contra o texto constante na atual PEC 45/2019 (reforma tributária), seja no que tange à forma de destinação dos recursos arrecadados, seja no que tange à forma de distribuição da cota-parte do IBS pertencente aos Municípios; 

  2. a favor da alteração do critério de distribuição da cota-parte devida pelos Estados relativos à sua arrecadação de IBS para atribuir, no mínimo, 50% do valor distribuído conforme a geração de riqueza de cada município, com esse índice vinculado ao nível de produção primária, industrial e serviços (para evitar grandes distorções hoje existentes -exceções do VAF-, admite-se limitação per capita do recebimento desses recursos, destinando-se o valor excedente à redistribuição do bolo); 

  3. Em não sendo estipulado o critério sugerido no item 2, seja definido que, no mínimo, 50% do valor a ser distribuído da cota-parte pertencente aos municípios, seja definido por legislação estadual, permitindo que cada Estado Brasileiro crie legislação equânime de distribuição dos recursos promovendo crescimento e desenvolvimento igualitário em seus municípios na forma como preconiza o inciso III do artigo 3º da Constituição Federal;

  4. Não se admita a eliminação da cota-parte devida pelos Estados aos Municípios sob o pretexto de o imposto ser único, pois, isso inviabilizaria a distribuição de riqueza, empobrecendo ainda mais municípios pouco consumidores.

O ideal para a distribuição das cota-partes seria a preservação do critério hoje existente nos incisos do Parágrafo Único do artigo 158 da CF/88. Entretanto, se encontrada inviabilidade da manutenção do critério do valor adicionado nas operações do IBS, seja adotada a redação da emeda à PEC 45/2019 apresentada no Senado sob o nº 362, de autoria do Senador Nelsinho Trad.

Os municípios Gaúchos mantêm firme a esperança da sensibilização e luta de sua bancada por suas sobrevivências.


Porto Alegre, 27 de novembro de 2023.

Luciano Libório Orsi

Presidente da FAMURS


Ações da Famurs sobre a reforma tributária

Desde o início do debate sobre a reforma tributária, a Famurs manteve o seu posicionamento de que, quando disponibilizado o texto na íntegra, fosse dado o tempo necessário da sua leitura e reflexão aos parlamentares. No entanto, a tramitação da reforma tem acontecido com um atropelo de informações e nenhuma confirmação no que se refere à distribuição dos recursos arrecadados. 

27 de fevereiro -  Presidente Paulinho Salerno participa da reunião do Conselho Político da CNM, que definiu as últimas estratégias dos gestores para sensibilizar o governo e parlamentares por uma reforma tributária que atenda ao movimento municipalista. Estudos da CNM detalham crise fiscal dos municípios e embasam luta por uma reforma tributária justa. 

14 de março -  Na Assembleia de Verão, o tema fez parte da programação e foi pauta de um painel apresentado pelo presidente da CNM, Paulo Ziulkoski. O posicionamento das entidades municipalistas foi de que a reforma tributária apresentasse como premissa preservar a autonomia dos municípios.

22 de maio - A Famurs sediou uma audiência pública para tratar sobre o que muda para os municípios com as alterações no sistema tributário brasileiro, a partir das PECs 45/2019 e 110/2019. A audiência fez parte do cronograma de trabalho da Comissão Especial para Acompanhar e Debater a Reforma Tributária, da Assembleia Legislativa do RS, cujo objetivo é conectar o Parlamento gaúcho com o debate nacional. 

16 de junho - Famurs participa de audiência pública a convite da OAB/RS e do Fórum dos Conselhos Regionais e Ordens das Profissões, para debater as propostas em tramitação da reforma tributária e suas repercussões para a sociedade. 

29 de junho -  A gestão 2023/2024 realiza sua primeira Assembleia Geral Extraordinária, presidida por Luciano Orsi. Um dos temas discutidos foi a reforma tributária, tendo em vista a possibilidade de uma rápida votação, sem que os gestores saibam como e qual será o impacto nos municípios. Por unanimidade, a Famurs se manifestou a favor de uma reforma tributária, mas com a retirada do regime de urgência de votação da proposta.

30 de junho -  A Famurs recebeu o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, na sede da Federação. Acompanhado do secretário municipal de Fazenda, Rodrigo Fantinel, Melo registrou sua preocupação em relação à reforma tributária e a importância da união entre os municípios.

4 de julho -  Presidente Luciano Orsi esteve em Brasília para posicionar a Famurs contrária à votação da PEC 45/2019 em regime de urgência. Para a entidade, a decisão foi prematura e sem ampliação dos debates com os entes federativos envolvidos, além de não haver justificativas para o regime de urgência estabelecido. 

6 de julho - Missão Municipalista reúne municípios da Amufron e Amuceleiro, em Horizontina, e discute, entre os temas prioritários do encontro, o impacto da reforma tributário nos municípios. 

7 de julho - Famurs reafirma posicionamento favorável à simplificação tributária sem perdas para os municípios, após aprovação da reforma tributária na Câmara. Entidade declarou que estaria atenta aos desdobramentos da aprovação no Senado e nas regulamentações por lei complementar com foco em garantir mais receitas para os municípios. 

13 de julho - Com objetivo de esclarecer dúvidas e atualizar os gestores no andamento de temas que impactam diretamente os municípios e suas receitas, a Famurs realizou o Encontro com Prefeitos(as), reunindo mais de 200 participantes. Entre os temas abordados, os pontos positivos e de atenção aos municípios a respeito da reforma tributária. 

14 de julho - Participação, por meio de videoconferência, durante a reunião da Ampla para debate e explanação sobre a reforma tributária.

4 de agosto - Técnicos da Famurs reúnem-se, em Manoel Viana, com os municípios integrantes da Amfro para debate sobre a reforma tributária.

8 de agosto -  Videoconferência com a Amcentro e Amm para debate e explanação sobre a reforma tributária.

10 de agosto - Missão Municipalista reúne municípios da Amzop, em Palmeira das Missões, e discute, entre os temas prioritários do encontro, os pontos de atenção dos municípios a respeito da reforma tributária. 

15 de agosto -  O presidente Luciano Orsi participou, como mais mil prefeitos, de um grande debate promovido pela CNM sobre emendas à reforma tributária na busca de justiça aos municípios, apresentando a proposta da Famurs no encontro.

16 de agosto - O presidente Lucinao Orsi é recebido pelo senador Paim, que declara a necessidade da Famurs ser ouvida pelo Senado ante aos relatos realizados durante a reunião.

28 de agosto -  Na programação da Casa Famurs na Expointer, prefeitos, secretários e técnicos municipais de Fazenda e Finanças estiveram reunidos para atualizações sobre a reforma tributária, com destaque para pontos positivos, de alerta e de atenção aos municípios. 

28 de setembro - Famurs participa de audiência público no Senado Federal acompanhando as manifestações da CNM, ABRASF e FNP.

3 e 4 de novembro -  O presidente Luciano Orsi participou de uma ampla mobilização de prefeitos em Brasília. No Senado Federal, a entidade integrou audiência pública da Comissão de Constituição e Justiça, que debateu os impactos que as alterações no Sistema Tributário Nacional podem provocar nos municípios. A Famurs foi a única federação de associações de municípios do Brasil que conseguiu espaço para propor ajustes ao atual texto PEC 45/2019 aprovada na Câmara dos Deputados. Dois pontos essenciais foram apresentados aos parlamentares: alteração no critério de repasse do IBS aos municípios e a criação de um dispositivo que possa garantir ressarcimento aos municípios com a extinção do IPI.

27 de novembro -  Famurs encaminha Carta Aberta à bancada gaúcha se posicionando contrária ao texto da PEC 45/2019, por entender que a proposta compromete a sobrevivência de inúmeros municípios brasileiros no futuro, inclusive gaúchos.

Informações da notícia

Data de publicação: 29/11/2023

Créditos: Ellen Renner